terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Escravos - é sério!

Aprendemos na escola que os escravos eram negros que foram trazidos à força para o nordeste do Brasil com a intenção de realizar trabalhos para os brancos europeus. Assim como os índios, que não eram apenas catequizados, pois na porção sudeste de nossa terra amada a chegada de negros escravos era dispendiosa devido à distância e os bandeirantes os capturavam para a escravidão nas lavouras paulistas.



Depois, crescemos e descobrimos o significado de preconceito, racismo, desigualdade social. Talvez até que a violência seria fruto disso. Negros seriam favelados, ladrões, e até macumbeiros!



Nos aprofundamos mais no assunto desencavando a noção de diferença religiosa, de quem vai para o céu ou para o inferno, e que os escravos eram proibidos de praticar sua religiosidade pagã, idólatra, bárbara, demoníaca. Nem mesmo teriam alma. Nem negros nem índios deveriam existir, apenas os cristãos. E descobrimos textos de jesuítas que por um lado criticavam os maus tratos cometidos por senhores de escravos, mas por outro pregavam o trabalho árduo dos escravos para purificar seus corpos visando à salvação. Admoestavam os senhores que privassem os escravos dos sacramentos da igreja, mas taxavam estes de preguiçosos quando desafiavam os senhores, pois não eram “bons escravos”.

Foram suprimidos, espremidos, sufocados. Tiveram o sangue derramado. Mas resistiram. O cristianismo branco europeu não triunfou. Mas foi quase... e ainda hoje é maioria.

Hoje. Mais de um século após o assim chamado fim da escravidão. Quando ‘liberdade’ é entendida como ‘Faze o Que Tu Queres’ e falar o que pensa sobre tudo é sinal de inteligência – resultado lógico da existência da internet.



Nós – eu e você – temos uma crença.

Acreditamos que as redes sociais alcançaram o mundo e além. Que todos estão conectados e felizes com imagens e informações, atingindo, invadindo, penetrando todos os lares e recantos. Sabemos de tudo. Nada nos escapa. A internet nos deu onisciência.

Pois bem.

Você sabe quem são os 52 escravos libertados numa zona rural do Estado do Pará, nesse início de 2012? Os 35 libertados, incluindo três adolescentes, de uma área da Madeireira Miguel Fortes em Bituruna, Estado do Paraná? Os 38 escravos na construção da Usina Hidrelétrica de Jirau, em Rondônia? Os 81 escravos utilizados na Usina Paineiras, em Itabapoana, RJ, em 2009? Os 95 escravos da Fazenda Marrecas, em Campos dos Goytacazes, RJ, em 2010? E os 401 encontrados na Usina Santa Clotilde S/A, Alagoas, em 2008?

E os 11 escravos libertados em 2010 da fazenda de Fernando Jorge, este um dos homenageados pela Câmara de Cubatão anos antes, mesmo após denúncias? E os 39 escravos na colheita de café, em Marechal Floriano, Espírito Santo, sob a supervisão de Luiz Carlos Brioschi e Osmar Brioschi, este homenageado com placas e diplomas na Assembléia Legislativa do Espírito Santo dois dias depois da divulgação da libertação de seus escravos?

Nove escravos foram encontrados, em 2009, sob as asas do político Evanildo Nascimento Souza, na época secretário do Meio Ambiente de Goianésia do Pará (PA). Isso mesmo que você leu: Secretário do Meio Ambiente.

A Região Centro-Oeste de nosso amado país liderou o número de libertações em 2011, conseguindo libertar 742 escravos. Um ano antes, o Sudeste resgatava 992 homens, mulheres e crianças da condição de escravidão.

As fazendas de gado, os canaviais, as carvoarias são as atividades que apresentam maiores índices de libertação de escravos. A construção civil e oficinas de costura também elevaram a estatística da exploração.

Mas quem vê esses escravos? Você vê? Eu vejo? Não, não vemos. Mas não porque eles estão encobertos no meio do mato, numa distante fazenda, nem na zona rural, ou florestal.

 

Não!



Não sabemos disso porque não é divulgado. A imprensa não divulga. Não pode divulgar. É matéria perigosa para jornalistas apontarem os olhos. Não existem olhos direcionados para os escravos.

Enquanto se comemora em 25 de março o Dia Internacional em memória das vítimas da escravidão e do tráfico transatlântico de escravos e 13 de maio comemora-se a Abolição da Escravatura no Brasil, homens, mulheres e crianças, negros, brancos e mestiços, pessoas iludidas por propostas falsas de trabalho, continuam em regime de escravidão.


Desde 1995, quando o Governo reconheceu a existência de trabalho escravo no Brasil, aproximadamente 40 mil seres humanos foram resgatados dessa condição, uma média de 2.600 escravos livres por ano. E em 2011, a estimativa era de que pelo menos 20 mil trabalhadores estariam presos em regime de escravidão.

A fiscalização continua. Silenciosa. Longe dos holofotes. Longe de você. Longe de nós.

Não existe contos de fadas no mundo real. O sofrimento para manter nosso conforto e regalia é desumano. Cada um tem nas mãos o seu chicote, apenas não conseguimos enxergá-lo.

 

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